Alice e Jonas eram casados há cinco anos.
Viviam relativamente bem; e quando eram questionados sobre o cotidiano, invariavelmente, respondiam que "Nenhum casal tem uma vida perfeita! Por que nós seríamos o primeiro?"
As famílias, amigos e conhecidos do casal acompanhavam à distância o desenrolar de pequenos episódios de desentendimento e traição.
Alice sempre procurava um jeito de "ficar de bem" e também aceitava as traições com bastante facilidade; Jonas, por sua vez, era sempre grosseiro com a esposa, chegando ao ponto de destratá-la na presença de parentes, amigos e conhecidos - demostrava, gratuitamente, descontentamento com situações cotidianas e tecia comentários sobre a esposa, que constrangiam à mulher e quem estivesse por perto.
Os dias passavam em cenários de nuvens: umas mais claras, outras mais pesadas... mas sempre com a ameaça de chuvas, e todos os contratempos que essas podem causar. Alice, dia após dia, momento após momento buscava minimizar e dar por "resolvido e esquecido" todos os descontroles do marido. Nos últimos tempos nem se dava mais ao trabalho de explicar as desagradáveis situações que vivia ao lado de Jonas, ao contrário, tentava, falando o menos possível, apresentar as "razões" para aquelas atitudes - ninguém conseguia entender, compreender e/ou aceitar a defesa que aquela mulher empreendia a favor do marido.
Algumas pessoas deixaram de falar com Alice, simplesmente porque não conseguiam mais conviver com situações tão humilhantes e desumanas; outras tentaram "abrir seus olhos", comentando o que viam e ouviam... ela emendava suas explicações e uma mistura de "caras, gestos e poucas palavras", para encerrar aquelas conversas! Um terceiro grupo de parentes, amigos e conhecidos determinaram que "se aquilo tudo estava bom para Alice, também estava bom para elas"!, e se negavam a discutir, a favor ou contra, aquela forma de viver.
Assim os dias foram passando - Jonas insatisfeito, resmungando da mulher e cometendo traições e Alice "colocando panos quentes", para manter o casamento e não destruir o que sentia pelo marido.
Numa tarde, após um almoço em família, Alice convidou Jonas para um passeio em grupo; ele, que "mal tinha tocado na comida", levantou e disse: "- Não! Eu vou me deitar!"; a esposa, como era costumeiro, tentou "ajeitar" a situação, para que não parecesse tão mal para os parentes e, ao mesmo tempo, atender à vontade de Jonas. Todos saíram para o passeio, comentando sobre mais essa situação, enquanto Alice tentava conversar com Jonas.
O marido estava irredutível e, como sempre, destratou Alice; dessa vez foi mais cruel e falou "com-e-sem-razão" sobre o jeito, a pessoa e as atitudes da mulher.
Alice ouviu tudo calada; naquele dia não sentiu vontade de discutir ou "emendar conversa"; ficou imóvel... e enquanto Jonas dizia "isso-mais-aquilo", Alice imaginou que era uma cômoda antiga, com quatro gavetas com alças de metal... sentiu que todas as gavetas estavam cheias de roupas gastas, estragadas e sujas... e todas eram do marido!
Voltou a ouvir as palavras duras e "bem pensadas" de Jonas; palavras que machucaram como nunca tinham machucado; palavras mentirosas... E as gavetas iam caindo no chão e as roupas eram levadas por um vento forte... Alice ouviu a frase: "Eu não gosto mais de você!" e viu um sorriso debochado no rosto do marido... As gavetas vazias eram recolocadas na antiga cômoda, uma a uma pelas mãos do pai de Alice -seu melhor amigo na vida!... Um silêncio "acordou" Alice; Jonas estava calado, olhando de forma desafiadora para a esposa; ela sentiu um estranho alívio - tudo era mais leve, "mais possível". Ela saiu de casa, alcançou os parentes no quarteirão e foi para o passeio.
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