domingo, 19 de agosto de 2012

A SOLIDÃO DE MERI.


Meri chegou cedo a casa; beijou os filhos; mudou de roupa e foi para a cozinha – “hora de preparar a jantar!”, pensou.
Aos poucos foi pegando uma, duas panelas, legumes, faca, colher... e, enquanto descascava e cortava batatas e inhame, ia pensando na vida.
Os olhos fixos no trabalho de casa denunciavam um pensamento longo, cheio de detalhes; de vez em quando balançava a cabeça, como querendo afastar os pensamentos ou as palavras, mas, sem sentir, estava novamente com os olhos na pia, nos legumes e nas panelas, pensando...
Foi até o quarto e trouxe algumas roupas e colocou nos baldes; reclamou com os filhos sobre as brincadeiras barulhentas e voltou para a cozinha. Mais uma panela e a ‘carne’ foi para o fogo e, depois, o arroz. Meri continuava com aquele olhar, quase imóvel, a cabeça também...
Num meneio de cabeça limpou os olhos – estava chorando – e um dos filhos, que estava observando a mãe desde que ela chegara a casa e não brincara com eles, viu tudo, mas também ficou em silêncio. Não sabia o que tinha acontecido, mas evitava ‘bulir’ com a mãe nesses dias de choro. O menino levantou da sala, foi até a cozinha, encostou na mãe e a abraçou forte, sem dizer uma palavra. Em silêncio, Meri aceitou o carinho, até que ela falou: “Chega pra lá, menino. Tenho que terminar a janta!” E ele voltou para a sala, para ver televisão.
Meri voltou para o quarto e chorou, agora sem medidas e sem cerimônia. Chorou ‘de fazer barulho’, mas nenhum dos três meninos foi até o quarto – eles sabiam que a mãe não gostaria de carinhos ou palavras nessas horas.
Depois de alguns minutos ela voltou para a cozinha, cabeça baixa, rosto vermelho e olhos inchados e, pegando uma colher, mexeu nas panelas, provou o arroz e os legumes.
Um silêncio se fez na casa; os meninos já estavam sentados e calados, desde que ela começou a chorar no quarto, e assim continuaram, esperando o jantar.
Meri não olhava para eles, mas eles, ao contrário, não tiravam os olhos dela.
Depois de algum tempo, a janta foi servida e todos sentaram no sofá e assistiram televisão até o final da novela. Depois cada um foi escovar os dentes e se deitar. E Mari ficou sozinha – ainda mais sozinha.

Um comentário:

  1. Há momentos infelizes em que a solidão e o silêncio se tornam meios de liberdade.

    ResponderExcluir