Sentada num banco de uma praça grande e movimentada, Alzira segura com uma das mãos um carrinho de feira, no qual traz seus poucos pertences úteis e um "bocado" de coisas inúteis, que catou aqui e ali (coisas que achou bonitas e interessantes e que espera que tenham uso em algum momento); a outra mão segura o encosto do banco, equilibrando seu corpo cansado e quase adormecido.
O vento frio incomoda Alzira, mas, as duas camisas e a calça a protegem. Algumas pessoas passam pela praça, como o vento, rápidas e individualistas. Algumas olham, e Alzira tem certeza que elas pensam muitas coisas, porém poucas verdades, afinal "ninguém sabe da minha vida e das minhas lutas" - uma frase feita que adorava dizer há muitos anos; hoje-em-dia nem se dá mais ao trabalho de repetir a frase, e nem sabe bem porque lembrou dela... talvez por causa daquelas pessoas e dos que elas pensam, ou do que a Alzira imagina que elas pensam!
Um homem mal vestido e sujo chega perto dela e "puxa" conversa; fala de forma embolada, sem nexo e, ela, não responde e lança sobre aquele homem sujo um olhar de desaprovação e raiva; e ele se afasta. O homem ainda olha uma ou duas vezes para trás e encontra o mesmo olhar firme e desaprovador de Alzira.
Já era tarde, pois a loja de fast-food acabou de fechar, e ela sempre abaixa as portas de "ferro" em torno de dez-e-meia.
Os atendentes colocam na porta da loja os grandes sacos pretos de lixo; Alzira sabe que naqueles dois ou três sacos, enormes, encontrará alguns sanduíches e sobremesas - inteiros ou pela metade -, e esses serão seu alimento nesta noite, fria e esvaziada.
Alzira se levanta e caminha até os sacos pretos, puxando seu carrinho de feira com seus utensílios e trecos; abre o primeiro saco e encontra dois sanduíches inteiros, cuidadosamente enrolados, como se estivessem esperando por ela ou se tivessem sido colocados lá por alguém, que sabia da busca que aquela mulher, com duas blusas, calça, sapatos e lenço na cabeça, faria logo depois do fechamento da loja.
Alzira pega os dois sanduíches e os guarda no carrinho de feira, olha para os lados, procurando algum olhar indiscreto ou perigoso, e se afasta para baixo de uma árvore, na sombra das luzes dos postes. Senta calmamente e come devagar os dois sanduíches.
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