Entrei em casa e tudo estava organizadamente fora do lugar.
Apesar das cadeiras estarem arrumadas, a mesa, o sofá, a televisão e a estante de livros... tudo estava fora do lugar.
Um sentimento de 'filme de espiões norteamericano' tomou conta de mim. Instintivamente me encostei na parede entre a sala e o corredor do banheiro e quartos.
"Enlouqueci!", pensei.
"Que nada! Se não me preparo para o pior e saio andando pela casa e dou-de-cara com um homem (ou uma mulher) todo vestido de preto, touca e uma faca afiada na mão...? Aí, já era!"
"Enlouqueci! Enlouqueci...!" Mas dizia isso a mim mesmo sem desencostar da parede e 'lançar' um olhar 'james-bond' pela sala, tão organizadamente fora do lugar e as perguntas íam aterrisando em meu cérebro: "Quem teria feito isso?" "Qual o motivo?" "Quando isso teria acontecido?" "Foi Mariza, aquela ex-empregada louca, que tomava café com refrigerante e um antidepressivo tarja preta..." "Não" Claro que não... Mariza morreu de overdose daquele xarope multifuncional que consumia em grandes goles e fartamente durante os dias em que trabalhou aqui... qual o nome do tarja preta? Garde... sei lá..."
De repente percebi um detalhe, um pequeno detalhe, no canto esquerdo sobre a televisão - "Tinha uma caixa de remédios ali, mas não estava mais... Era a única coisa fora do normal, além dos móveis estarem todos fora do lugar. Foi Mariza! Mas como? Ela morreu, eu tenho certeza, eu fui no enterro."
Resolvi me virar e entrar no corredor. Fiz isso com cautela, pois vai que aparece um cara... Virei na direção do corredor e fui andando, pensando e sentindo cada passo. Um, dois, três e olhei para dentro do meu quarto e mais um susto - lá estava o fogão, sem o botijão de gás, a mesa da cozinha com quatro pratos, copos e talheres, prontos para um jantar! - procurei manter a calma, afinal seria isso até o final - a desordem, mas com requinte e bom gosto.
Mais dois ou três passos e eu entrava na cozinha, com a luz acessa e apenas dois móveis: a mesinha de cabeceira (o 'bidê') e a geladeira, desligada e com a porta aberta.
Dentro da geladeira os meus dois travesseiros e o pijama, perfeitamente dobrado. Um arrepio subiu pela minha coluna e alcançou minha cabeça quando de trás de mim veio um barulho, que não foi forte, mas que destoava do silêncio que reinava na casa - olhei pra trás rápido e vi Mariza, em pé, com uma bolsa no ombro e olhando para mim.
Pensei em gritar: "Eu sabia!", mas não tive a força necessária. Ela tinha morrido, eu fui no enterro, eu comprei flores, doze rosas - sete brancas, quatro chá e uma vermelha... eu mesmo arrumei as flores! Uma confusão enorme tomou minha mente e eu já não conseguia mais pensar direito.
Marisa me pegou pelo braço, me sentou no 'bidê' e meteu a mão no bolso da minha calça - eu reagi: "Louca! Abusada! Morta!" E tirou uma caixa de remédios, tarja preta, e pegou um copo de água e mandou eu tomar uma drágea. Olhei para ela e disse suplicante: "Tem café e refrigenrante?"
Mariza andou até a geladeira e fechou a porta. Sem dizer sequer uma palavra!
Vamos num terreiro de Umbanda ver o que Mariza queria?!?!?!
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